Gonçalo M. Tavares
O
RELÓGIO DA TORRE
Um homem bem vestido pára no meio da praça e levanta
a cabeça. Com os movimentos de quem parece confirmar as horas pelo relógio
gigante da praça central, o homem bem vestido vai acertando o seu relógio de
pulso.
Olhamos agora para o relógio da praça central e
vemos que ele está a ser arranjado: há vários homens em seu redor. E se esses
homens parecem macacos que, em vez de se apoiarem em galhos, se apoiam em
ponteiros metálicos gigantes, se por instantes parecem macacos, segundos depois
parecem médicos em redor de um corpo qualquer que está a sucumbir e eles ― meio
eléctricos e acelerados, outras vezes com uma calma que não se percebe ― ali
estão, em redor daquele corpo em forma de círculo, tentando recuperar os batimentos
do único coração que, de facto, faz falta.
De qualquer maneira, o homem lá em baixo continua à
espera.
Gonçalo M. Tavares (2011). «O Relógio da Torre».
In: Short Movies. Alfragide: Caminho,
p. 143-144.
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